quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Tropicalista, Graças a Deus

As pessoas que dizem só gostar de MPB fazem um “patrulhamento cultural” dos pecados, contra os outros estilos musicais: axé music, sertanejo, arrocha, funk... Mas, antes de qualquer coisa, vamos procurar definir o que é “popular”: do povo, comum, barato, conhecido... Baseado no significado da palavra “popular”, quem é mais popular: Chico Buarque ou Amado Batista? Quem é mais popular: Ivete Sangalo ou Caetano Veloso? Então esta “classificação” está errada. Os “mpbistas” geralmente cobram “poesia” na musica. O que esses “patrulheiros” precisam aprender é que nem sempre a poesia “se encaixa” em qualquer estilo musical. Tem muito pagode baiano que praticamente não precisa de letra nenhuma. É só o “cantor” ficar enrolando: em cima, embaixo, pro lado, pro outro, pra frente, pra trás... E o suingue da musica vai levando o povo. E quando o compositor coloca uma letra engajada (ou poética) em certos estilos, a musica não chega a ser muito divulgada... Portanto não é bem “digerida”. Um bom exemplo é o Zezé de Camargo: ele fez uma musica que é um verdadeiro protesto (E Deus Por Nós), mas essa musica não foi muito executada, apesar do sucesso da dupla Zezé de Camargo e Luciano. Então isso não chamou a atenção dos “patrulheiros”. Outro exemplo é o do grupo baiano Terra Samba, que chegou com a proposta de mudar um pouco o cenário musical baiano, apresentando musicas mais “engajadas”, bem diferentes das musicas do É o Tchan! e outros  grupos que faziam sucesso na época. Parece que as musicas do Terra Samba não agradaram tanto.  Afinal, uma musica para entretenimento tem que ser para “distrair” mesmo. Não cabe ficar fazendo o povo lembrar (ou saber) de problemas. Assim sendo, ninguém vai se distrair. Se estou bem informado, o (a) Axé Music começou como musica para o carnaval. Depois foi ganhando o resto do ano, e chegou até onde está. Então se o Axé Music começou como musica para carnaval, ele é “descendente” direto de Alalaô, Me Dá Um Dinheiro Aí, Se a Canoa Não Virar... E outras marchinhas que são cantadas até hoje, com muito gosto, até por alguns desses “patrulheiros”. O que fico reparando é o seguinte: enquanto esta turma “mpbista” fica fazendo uma discriminação enorme contra os outros estilos, Caetano Veloso aplaude, abraça e apoia todos eles. O próprio Caetano, no auge do Tropicalismo, foi vaiado ao entrar num palco com o cantor Odair José, porque Odair é considerado um cantor “brega”. Enquanto os “patrulheiros” ficavam cobrando de Roberto Carlos um “engajamento político”, Caetano estava dando musicas para Roberto gravar. Caetano gravou a musica “brega” de Fernando Mendes: Você Não me Ensinou a Te Esquecer, e o Brasil todo cantou. Até por trás dos “bastidores musicais” também tem muito artista cheio de preconceito, e sem respeito nenhum ao colega. Não gostar do estilo que o artista canta é uma coisa, desfazer é outra. Li que um pianista estava tocando a musica Tortura de Amor, e alguém perguntou se ele sabia quem era o compositor daquele musica. Ele respondeu que não sabia. Quando a pessoa revelou que a musica era do Waldick Soriano, o pianista parou de tocar. Teve um outro (que não vou revelar o nome) que estava escolhendo  musicas para o repertório do seu novo disco, quando alguém sugeriu que ele gravasse “Quem Sabe”, uma musica de Carlos Gomes. Ele então respondeu: essa musica não, porque já foi gravada por “outra pessoa”. Essa “outra pessoa” que ele estava se referiu é o grande Agnaldo Timóteo. Acho que são estas discriminações “internas e externas” que atrapalham o nosso “progresso” musical. Se os “patrulheiros” querem brigar com alguém, que briguem com a mídia. Ela que é a responsável pela propagação dessas musicas. O Maestro Isaac Karabtchevsky disse que se divulgassem a musica erudita, o povo acabaria gostando de musica erudita.  
A respeito do título, tornei-me Tropicalista porque na minha juventude, as pessoas da minha geração gostavam mais da Jovem Guarda. Enquanto que eu, além de gostar da Jovem Guarda, gostava também da “Velha Guarda”, de Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Luiz Vieira, Ademilde Fonseca e muitos outros. A Jovem Guarda chegou, praticamente, sepultando o pessoal da “Velha Guarda” e da Bossa Nova. Já o Tropicalismo chegou com o lema da Antropofagia: “Encaixo tudo, somo, incorporo”. Quando vi que essa era minha praia, mergulhei de cabeça.

A.J. Cardiais
imagem: google

Um comentário:

Ana Bailune disse...

Preconceito é burrice. É triste.